A Biblioteca Municipal de Mesão Frio voltou a acolher mais uma sessão das “Tertúlias na Biblioteca”, desta vez dedicada ao trabalho de João Pedro Marnoto: “Nove Meses de Inverno e Três de Inferno”.
A tertúlia iniciou com o fotógrafo e realizador português a apresentar a exposição e a contar a história por detrás das suas fotografias. Nesta viagem pela região, João Pedro Marnoto pôde “explorar-se a si próprio” enquanto se foi apercebendo do paradoxo inequívoco entre a vida no meio rural e o quotidiano citadino. Este trabalho é assim o resultado da experiência pessoal e da sua vivência na região, que se estendeu no Douro durante cerca de 10 anos.
"Mais do que a temática é a forma como se olha para o território. Estamos acostumados a ver o retrato desta região de forma muito paternalista, mas por trás existem vidas duras e é essa dureza que traz riqueza", afirma.
Através da exploração da região e das narrativas que encontrou, fez das terras do Douro e Trás-os-Montes a sua segunda casa. Com as pessoas que encontrava ia gravando conversas e registando momentos, congelando-os “além da fotografia”. Assim nasceu o filme com o mesmo nome da exposição, onde se documenta a vivência na região durante 12 meses, captando as tradições, usos e costumes, numa perspetiva ambiental e sociológica.
"O filme tem o som, a música, a emoção e as palavras. É um aprofundar dos testemunhos que apanhei, entre muitas outras coisas que não foi possível gravar", é assim que João Pedro Marnoto explica a necessidade de captar em vídeo os testemunhos das pessoas com quem se cruzou.
Presente esteve Miguel Nóvoa, da Associação de Estudo e Proteção do Gado Asinino, um dos locais filmados para o documentário.
Deste filme, que acredita vir a “perpetuar-se no tempo”, fez então também parte o registo da ligação dos burros com o território, com o apoio constante dado pela associação.
Paulo Silva, Presidente da Câmara Municipal de Mesão Frio, considera que “mais importante do que fazer o filme chegar a televisões ou aos principais meios de comunicação, é fazê-lo passar nas autarquias e nos pequenos meios”.
A realidade transmitida no filme “vai desaparecendo”, acredita o autarca, sendo que a evolução da região vai transformando as suas tradições e costumes.
“É importante trazer as tradições de volta e a autarquia tem feito esse trabalho. A Feira dos Burros e a colaboração com a AEPGA é um exemplo disso”, reitera Paulo Silva.
Despoletado pela visualização do filme, surgiu ainda um debate sobre temas como o despovoamento, a falta de mão-de-obra na região, o preço do vinho, a agricultura como forma de subsistência, entre vários outros que integraram uma discussão aberta entre João Pedro Marnoto e o público presente.
Jorge Portela, um dos elementos do público, foi levado numa viagem à sua infância durante a visualização do documentário.
"Tudo o que vi é uma realidade daquilo que foi a minha infância. Chamou-me à atenção o facto de percebermos que no meio rural temos tudo para a nossa subsistência", concluiu.
A perspetiva de Fernanda Ferreira, também presente na plateia, foi ligeiramente diferente. “Embora não me identifique completamente com o que vi, acho que ainda hoje se vive assim, em Trás-os-Montes profundo”, reflete. “O filme exibido retratou bem a vida de muita gente transmontana”, acrescenta ainda.
A Biblioteca Municipal irá acolher a próxima “Tertúlia na Biblioteca” já no próximo dia 16 de fevereiro, com a presença de Rui Fernandes, professor e divulgador da Viola Amarantina.